FICHA TÉCNICA
,Senhor Engenheiro
Senhor Corruptor
Euzinho
etc.
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I . Pulinho e Saltinho
.São 14 horas dum dia de Verão do ano de 1988. Conduzo, como sempre, aceleradamente, a viatura que transporta o meu patrão: o Senhor Corruptor, até à Sede da Administração dos CTT, situada naquela altura na Rua de S. José, em Lisboa.
Fomos à procura do Senhor Engenheiro (administrador daquela instituição), um indivíduo na faixa etária dos sessenta, muito elegante e estimado pela sua verticalidade, honestidade, competência... O porteiro tirava sempre o boné e inclinava-se numa ridícula vénia sempre que o Senhor Engenheiro entrava ou saía daquelas instalações sumptuosas. À porta, estacionado quase sempre em segunda fila, o seu motorista, fardado de fato e gravata, usava também um boné, que retirava sempre que corria a abrir a porta da viatura, ajudando a ajeitar o casaco de linho do Senhor Engenheiro.
Porém, naquele dia, foi-nos dito que Sua Excelência, o Senhor Engenheiro, estava ausente.
O meu patrão, o Senhor Corruptor, entrou rapidamente na viatura, arregaçando as calças para não desfeiar a zona dos joelhos, esticou os punhos da camisa e ajeitou a gravata de seda, tudo adquirido na Loja das Meias. Aqueles gestos já constituíam um ritual.
- Euzinho, 'bora lá na gáspia para Campo de Ourique. Vamos passar pela casa do gajo. Talvez lá esteja.
- Então, Senhor Corruptor, vamos por onde? Julgo que o mais rápido, para fugirmos ao trânsito é...
- Euzinho!!! Olha em frente e acelera esta m.....!!!
Chegados a Campo de Ourique mandou-me parar em segunda fila, sobre a linha do eléctrico e esperar, saindo apressadamente.
- Euzinho, não desapareças daqui. Se passar algum carro eléctrico vais lá à frente e dás as voltinhas que forem necessárias.
E atirou com a porta, fechando-a com um pontapé.
.II . Pulinho e Saltinho
.Aguardei alguns minutos sem que um guarda-freio da Carris pisasse insistentemente com a botarra naquela peça metálica montada entre os seus pés provocando aquele trim-trim irritante.
Euzinho : Lá vem a besta! Foi rápido! O Senhor Engenheiro, provavelmente, não está em casa!
- Eh pá, nem me digas nada! Que bronca! Fui um empata! Vamos daqui p'ra fora, acelera, acelera que já te conto.
Tirou um cigarro do maço, atirando-o freneticamente para cima do tablier do carro, deu uma puxa bem puxadinha e, com um sorriso misto de indignação e contentamento lá me contou:
- Eh pá, tu nem imaginas! Aquele Senhor Engenheiro saíu-me um bom filho da mãe! Toquei a campaínha e passados uns instantes espreitou pelo "olhinho" da porta e, quando me viu, entreabriu-a. Estava despenteado, vestindo um pijama de seda com desenho japonês, levou o dedo indicador direito ao nariz, pedindo-me silêncio.
- Então, Senhor Engenheiro, estás doente? Eh pá, que chatice! E logo agora que a tua mulher e o teu filho estão em Londres!...
- Fala baixo, Corruptor. Tirei um dia de folga. Contratei, através dum anúncio de jornal, uma acompanhante boa com'ó milho... 'Tás a ver, não?
- Eh pá... mas... oh Senhor Engenheiro, não me digas que tiveste a coragem de levar a gaja para o quarto, para a cama onde dormes com a tua mulher!?
- Não, pá! Ia lá fazer uma coisa dessas! Julgas-me um depravado?
- Então, não me digas que estão no chão e a sujar um tapete persa!
- Qual o quê? Estou no quarto, mas no quarto do meu filho!!!